Na crônica “O Carnaval vem aí”, da Revista “Vida Capichaba”, do ano de 1931, comenta-se: “O reinado delicioso de Momo, a época delirante do carnaval, constitui, há anos, a festa máxima do capixaba, onde não se determinam limites nem represas às avalanches de alegrias e expansividade, que se desprendem da alma de cada um, influenciando, no seu desdobramento contagiante, para o apogeu da loucura coletiva”. Diversos outros textos, anúncios de fantasias e fotografias dos festejos em diferentes cidades permitem conhecer as características dos carnavais que envolviam os moradores nos desfiles, na compra das roupas e nas serpentinas dos salões. A revista “Vida Capichaba” faz parte do acervo do Arquivo Público do Estado do Espírito Santo (APEES).
Nos meses de fevereiro e março eram muitas as páginas dedicadas ao tema, como por exemplo, na edição de 15 de fevereiro de 1925, que traz uma análise sobre a história da comemoração: “Arqueólogos, glotológos, todos esses pacientes escavadores de coisas remotíssimas, de origens longínquas, ainda pesquisam e escoldrinham, nas suas raízes primitivas, a história do Momo, com as suas zombarias engraçadas, os seus adornos grisalhantes, a sua máscara irresistível”.
O material, assinado por Elpídio Pimentel, finaliza argumentando sobre a efemeridade da festa, mas que traz a possibilidade, renovada a cada ano, de vivenciar a alegria: “Passa o carnaval, mas os seus símbolos eternos – os pierrots, os arlequins, os intrujões, as colombinas, despidas das fantasias lantejouladas, do carmim, das miçangas (…) confundem-se tristes e fatigados, com nós outros, que formamos a multidão social, a comunhão humana, até que, no sábado de aleluia ou no ano próximo, recompondo as máscaras poluídas, as vestes amarrotadas, as galhofas canalhas, se possam de novo, entregar aos estouvamentos delirantes do outro carnaval”.
Na Revista havia espaço também para os burburinhos e fofocas que apareciam, principalmente, na coluna “Alfinetadas”, como se observa na seguinte nota: “O guapo viajante daquela casa importante da Rua 1º de Março divertiu-se grandemente no Carnaval e chegou a passar uma noite inteira sem ir ao Victoria, onde sabia muito bem que havia uma espanhola de xale, muito interessante e formosa, ansiosa por vê-la. Preferiu ele, que gosta de se divertir, certo par, no Democráticos, onde passou a noite inteira a dançar…”.
Anselmo Gonçalves, no livro “Carnaval: cem anos”, discorre sobre as festividades na cidade de Vitória, utilizando-se da memória dos moradores para trazer à cena as peculiaridades dos carnavais antigos. No final do século XIX, as comemorações ocorriam no Centro da cidade, com destaque à Rua do Rosário e à Sete de Setembro. Nesses locais ficavam também as vendas cheias de novidades para os foliões se arrumarem para a festa.
Ele destaca que a década de 1900 trouxe modificações nos costumes do Carnaval, pois confetes e serpentinas, vindos de Paris, deram oportunidade para a inventiva popular, passando esses elementos a serem aspectos de animação. “Era o surgimento das ‘batalhas de confete’ realizadas com requinte e luxo, de muitos chapéus coloridos, lenços brancos, vestidos de cintura baixa. Havia cansaço, mas havia também a recompensa de terem, os carnavalescos, realizado uma programação a cada ano mais empolgante, embora os jornais reclamassem sempre ‘Não se faz mais carnavais como antigamente’. Todos faziam questão de voltar para casa com a indefectível marca de que estiveram no carnaval, e os confetes sobre a cabeça eram as lembranças que mostravam a participação”.
Anselmo ressalta a importância do passeio dos blocos preferidos, fazendo com que os moradores desejassem conseguir o maior número de adeptos e alcançar o status de vencedor dos desfiles, embora não houvesse nenhum julgamento oficial. “Era pela ideia da intensidade do aplauso que se arraigava na alma pura do folião, a dedução de sua abstrata vitória” comenta o autor. As notícias corriam e as pessoas se empenhavam para contar as façanhas de suas organizações carnavalescas.